Pesquisar
Feche esta caixa de pesquisa.

Tião Carreiro e Pardinho com a Fôrça do Perdão

Sabe quando naquelas rodas de conversa entre amigos surge o assunto música e sempre vem um espertinho falando que odeia sertanejo universitário, pois acabou com o chamado sertanejo raiz? E para validar a sua tomada de posição, o cidadão afirma que respeita e muito as duplas antigas pela originalidade, lirismo, técnica de tocar a viola, dentre muitos outros argumentos? Mas no momento em que alguém pergunta o que ele conhece de sertanejo das antigas surge um silêncio sepulcral?

Pois bem, vergonha maior do que gostar de estilos comerciais com letras pífias e melodias pasteurizadas é mencionar um estilo que nem faz parte da formação e do gosto musical da pessoa para pagar de descolada (como inteligente, cult, hipster ou qualquer outra palavra que você deseje utilizar) e sair de bonzão.

E não tem nada de errado em gostar de música caipira ou sertanejo antigo, pelo contrário. A música é extremamente rica e agradável de se ouvir.

Mais do que falar sobre o estilo, que tal conhecer um pouco mais sobre o sertanejo raiz que sofre tanto preconceito sem motivo algum? Para isso eu escolhi falar de Tião Carreiro e Pardinho, a dupla que está para o sertanejo na mesma medida em que os Rolling Stones estão para o rock em termos de importância, influência, longevidade e qualidade musical.

A dupla gravou e se apresentou entre 1954 e 1993 quando da morte do mestre Tião Carreiro, com uma breve separação entre 1978 e 1981, e são os reis da música sertaneja de raiz e inventores do estilo pagode.

Não estou falando do pagode que você conhece, que é aquele samba mal tocado e sem graça que desgraçou a música brasileira principalmente nas décadas de oitenta e noventa, mas sim um estilo em que o violeiro precisa ser muito rápido e virtuoso, exigindo extrema habilidade de quem está com o instrumento em mãos.

Tião Carreiro e Pardinho gravaram 30 discos e inúmeros compactos ao longo dos anos. Isso sem contar que a dupla encenou as peças teatrais O Mineiro e o Iitaliano (divertidíssima história inspirada na música de mesmo nome que eles gravaram) e Pai João (que conta a história de um sertanejo já com idade avançada e seus dramas acumulados pela vida). Ainda é pouco para você?

Eles fizeram ainda um filme chamado Sertão em Festa em 1970 acompanhado da trilha sonora em LP e ambos foram um sucesso absoluto!

Musicalmente, tanto Tião Carreiro quanto Pardinho são virtuosos nas violas e violões, o que faz deles quase que autossuficientes quando o assunto era compor, gravar e se apresentar.

Neste disco de 1970, A Fôrça do Perdão (sim, força tinha acento antigamente) são poucos os músicos que acompanham a dupla, e nem precisava mesmo. As temáticas das letras tinham a vida no campo como cenário, mas, no fundo, todas as canções tratam das relações humanas e do caráter (ou falta dele) do homem.

Não, eles não falavam sobre embebedar uma mulher, trair o namorado, pois é sexta-feira e nem sobre como é bom trair e ser traído. A parada era mais inteligente e cheia de rimas ricas e referências calcadas na sabedoria da cultura popular.

 

Cochilou, O Cachimbo Cai abre o trabalho e foi a canção do disco que mais fez sucesso deste LP , trazendo na letra a importância de não deixar nada para depois, exaltando que aqueles que se levantam com o galo cedinho conseguem subir na vida. Tião coloca a si mesmo como exemplo e alfineta quem invejava o sucesso que a dupla alcançou sem saber o quanto eles ralaram para chegar lá.

 

Começo do Fim tem uma letra pra lá de divertida mostrando que tudo na vida tem o seu ciclo com versos como “No fim da cachaça vem a gandaia, É no fim do mar começo da praia…”

Velho Marrudo é de longe a melhor música do disco e uma das gravações que traz a dupla com diversos músicos – com destaque especial para o acordeão que cria diversas pontes rápidas entre os versos.

 

A letra é uma pérola! O pai de uma menina até aceita que ela namore, mas não gosta nem um pouco do caboclo pois já havia percebido que o cara não prestava. Na letra, Tião afirma que na sua casa só entra “gente direita” e que qualquer desvio de conduta do infeliz resultaria em um baita corretivo para, literalmente, mostrar para o cidadão “ … a volta que o mundo dá”.´

Lá Onde Eu Moro é uma canção bucólica que descreve a felicidade das pessoas que vivem em zonas rurais e não sofrem do estresse urbanodas grandes cidades. 

Homem Sem Rumo traz a desilusão de quem saiu de casa e não conseguiu se dar bem. O drama da letra mostra que enquanto a mãe reza para pedir sorte ao seu filho que partiu de casa, o mesmo não tem nem coragem de voltar para o seu próprio lar pelo peso da vergonha de ter fracassado. A vergonha é tamanha que nem durante o Natal ele dá as caras – com referência à Jingle Bells nos teclados e tudo.

O lado A fecha com a rápida Minha Mágoa, que traz um banjo atípico de fundo e um baixo em escalas aceleradas, mostrando que havia sim uma atenção ao que estava sendo feito musicalmente fora do Brasil.

O segundo lado do disco vem com a dançante Rio de Lágrimas que relaciona o rio de Piracicaba com as lágrimas de tristeza de uma mulher desiludida.

A interessantíssima João Bobo traz a dupla, sem acompanhamento de nenhuma banda de apoio, dando um show de dedilhados tal qual faziam em seus primeiros discos nos anos sessenta. A música também traz novamente outra prática comum da dupla: a de contar uma história com personagens e até mesmo um júri simulado no meio da canção.

Na história, João Bobo odiava esse apelido e acabou arremessando uma pedra em direção aos que zoavam dele – mas a pedra acerta precisamente no filho do delegado que acaba morrendo.

 

 

Tião Carreiro, no papel de “advogado”, consegue salvar a pele do pobre João. A dupla tinha a capacidade de contar uma história com começo, meio e fim cheia de personagens em menos de quatro minutos. Era a arte popular, das casas do interior, onde se sentavam na varanda para jogar conversa fora, musicada e registrada em disco.

 

O disco segue com a alegoria sobre uma confusão amorosa cheia de malandragem com O Gavião a e Andorinha.

A bizarra letra de A Casa descreve uma residência feita de comida – com nariz de porco sendo usado como tomada – em uma crítica ao custo de vida da época: se tudo der errado, pelo menos comemos a casa!

Nosso Romance é uma valsinha caipira delicada falando sobre o romantismo da vida de casal.

A Fôrça do Perdão, canção que dá nome ao disco, fecha os trabalhos com a história de um médico que foi assaltado e saiu ferido da ocorrência. Alguns dias depois, por ironia do destino, o médico já recuperado precisou atender um paciente que era, na verdade… o próprio assaltante do doutor!

 

Ah…e tem um programa que fizemos sobre eles que tá bem bacana de ouvir!  

 

Sobre o colunista

Compartilhe

outros conteúdos

2026: O Ano da música internacional em Curitiba!
Iron Maiden confirma show único no Brasil em 2026; veja preços
Rosé e Bruno Mars preparam nova faixa após sucesso global de “APT.”
Pai de Amy Winehouse processa amigas por leilão de itens da cantora
Filme da turnê solo de Jin, do BTS, estreia nos cinemas brasileiros em dezembro
Rock in Rio 2026 confirma Maroon 5, Demi Lovato e Jamiroquai; veja lineup parcial